[Nas crises] param as máquinas, ou então só as fazem trabalhar em parte do tempo, mais ou menos meio dia de trabalho; o salário baixa devido à concorrência entre desempregados, à redução do tempo de trabalho e a falta de vendas lucrativas; e à miséria geral entre os trabalhadores; as eventuais pequenas economias dos particulares são rapidamente devoradas, as instituições de beneficência veem-se assoberbadas, o imposto para os pobres duplica, triplica e contudo permanece insuficiente, o número de famintos cresce e subitamente toda a massa da população redundante aparece sob a forma de assustadoras estatísticas. Isto dura algum tempo; os redundantes safam-se melhor ou pior ou não conseguem sobreviver.
Engels, A situação da classe trabalhadora na Inglaterra
A crise brasileira atual – que é,
principalmente, uma crise das condições de acumulação de capital – tem lançado
as bases e efetivado, de forma rápida e violenta, uma renovação dos mecanismos
de exploração e, consequentemente, de opressão da classe operária e demais classes
trabalhadoras. Essa renovação dos
mecanismos de exploração e opressão das classes dominadas é a própria “modernização
capitalista”, que deve ser entendida, do ponto de vista dessas classes, como:
deterioração das condições de sua reprodução, ampliação da exploração e reforço
da ditadura da burguesia. Ou seja, como continuidade e aprofundamento das
relações de produção capitalista em um novo patamar, marcado pela ofensiva
burguesa na luta de classes em todos os terrenos – econômico, político e
ideológico.
Buscaremos
apresentar alguns dados e análises que corroboram essa tese, que é sentida na
pele por cada operário, por cada trabalhador da cidade e do campo,
especialmente nos últimos anos. Para uma análise marxista, científica, tomar
distância dos superficiais embates dos “partidos da ordem” (Fora Ele e Fora
Ela), que atualmente saturam o debate público, é a primeira condição. Caso
contrário, não se vai muito além de palavras de ordem vazias sem efeito prático
para os reais interesses dos trabalhadores – ainda mais num momento em que as
máscaras já caíram e os atores no palco querem remontar, cada um com sua
ladainha, as ilusões perdidas para um teatro já pegando fogo.
O bombardeio
à força de trabalho em período de crise
Uma
das condições essenciais para a retomada da acumulação capitalista em nosso país
passa necessariamente pelo ataque em várias frentes à força de trabalho.
Enquanto parte integrante da relação social de produção capitalista, a força de
trabalho, através da redução de seu preço/valor e de seus usos mais extensivos
e intensivos, possibilita a ampliação do mais valor gerado na produção
capitalista.
Esse é o terreno basilar da luta de classes e, por isso mesmo, foco constante da
burguesia. E sobretudo na crise! Independentemente das violentíssimas disputas
entre frações burguesas, a passagem pelo “chão da fábrica” é obrigatória, pois
diz também da dominação da classe burguesa como um todo e do reforço das
relações capitalistas[i]
contra o perigo de qualquer semente de socialismo.
Nos
períodos de crise como o que vivenciamos, todos os aparatos ideológicos e
repressivos se deslocam para gerar efeitos nessa esfera, com a mais intensa força.
“Ajustar” o gasto com a classe operária e as massas trabalhadoras, via salários
diretos e indiretos (benefícios, auxílios, políticas sociais etc.), “ajustar” o
disciplinamento das mesmas, tornam-se o eixo da ideologia e política dominantes[ii]. A queda da taxa de lucro da burguesia e dos
indicadores econômicos de sua economia são as justificativas mais que
necessárias para uma guerra declarada contra as condições objetivas de vida e
reprodução do proletariado e de todos os trabalhadores[iii].
Através das figuras ideológicas de nação, economia, mercado etc. a burguesia
visa gerar uma unidade onde existe um antagonismo: o operário é chamado a
apresentar sua contribuição à saída da crise que a todos afetaria igualmente. Ao
colaborar terá um promissor amanhã! Caso não colabore, obviamente fere o pacto
social burguês em período tão delicado e é preciso que toda violência estatal
esteja a disposta a intervir para o “bem de todos”. Não é tempo para distrações
“cômodas e liberais” como dizia Marx, e aqueles que não se encaixam aos novos
formatos do assalariamento precisam ser descartados: a cada nova fase do
capital, produz-se novos assalariados – normalmente com letras de sangue e fogo.
O
que vivenciamos hoje no país demonstra de forma clara toda a veracidade dessas
lições marxistas, que são acúmulo da experiência da classe operária por séculos
de escravidão assalariada. Vamos a alguns dados cabais.
A classe operária e o conjunto dos trabalhadores
brasileiros em meados de 2016: desemprego, arrocho, dívida, adoecimento,
repressão
Como
falamos em outro texto[iv],
a taxa de desemprego é um bom indicador para analisar como anda o mercado de
trabalho, melhor dizendo, a reprodução dessa mercadoria chamada força de trabalho
da qual o proletariado é refém. O desemprego diz diretamente da sua capacidade
de se reproduzir enquanto tal e da capacidade de barganha em torno preço pago
pela sua força de trabalho (peso do exército de reserva a depreciar os salários
ganhos pelos empregados[v]).
Ao
analisarmos a principal medição dessa taxa no Brasil, a situação é calamitosa,
atingindo 11,3% no segundo trimestre de 2016. O
cenário, que já estava ruim desde meados dos anos 2015, aponta para
continuidade da expansão da taxa de desemprego, que pode ultrapassar os 13% até
o final desse ano.
ALGUNS NÚMEROS DA PIORA DO MERCADO DE
TRABALHO NO BRASIL
Pelos
dados do IBGE, em junho de 2016, havia mais de 11,5 milhões de desempregados no
país[vi]. Ou seja, quase 5 milhões a mais que no segundo
trimestre de 2014. Desses, cerca de 2,5 milhões
“surgiram” apenas neste ano! Uma parte significativa dos novos desempregados é
da indústria, que se encontra em queda livre. Em comparação entre os segundos
trimestres de 2015-2016, esse setor sofreu uma retração de 1,4 milhão de empregados.
Pelos
dados do CAGED, o ano de 2016, até junho, já contava com um decréscimo de mais
de meio milhão de assalariados com carteira assinada. “Nos últimos 12 meses
verificou-se redução de 1.765.024 postos de trabalho, correspondendo ao
(de)crescimento[vii] de
4,31% no contingente de empregados celetistas do país.”[viii]
Desde
2015, o CAGED registra um verdadeiro massacre aos postos de trabalho com
carteira assinada em todas as regiões do país. Nos últimos 18 meses, já foram eliminados quase 2,2 milhões de empregos
formais no Brasil. No gráfico abaixo essa trajetória negativa é constante e
com uma aguda “entrada” em 2016.
Importante
ressaltar que o assalariamento com carteira assinada deve ser ponderado, tamanha
a informalidade no mercado de trabalho brasileiro. Para a última PNADC, no
último trimestre, verificou-se aumento tanto de pessoas assalariadas sem
carteira assinada no setor privado (3,7%) quanto daquelas que trabalham por
conta própria (3,9%). Somando as duas categorias, em termos absolutos, temos
basicamente o assalariamento no setor privado com carteira assinada – na casa
dos 30 milhões de pessoas.
Na
última Carta de Conjuntura do IPEA,
com dados do IBGE, vemos que a taxa de desemprego é maior entre as mulheres (no
primeiro semestre de 2016 chegando a quase 13%), entre jovens de até 24 anos
(26,36% no mesmo período) e com ensino médio incompleto (14,95%).
Como
mostrado em texto anterior, há a tendência atual de abertura de vagas
basicamente em baixas faixas salariais, substituindo os empregos com salários
maiores (em queda). Segundo dados do CAGED[ix],
apenas as faixas até 1 salário mínimo tiveram saldo “positivo” de vagas em 2016
até o momento (cerca de 95 mil). Em 2014, a faixa se estendia até 1,5 salário
mínimo – faixa de ouro (sic!) do período petista e seu “pleno emprego
(precário)”. Todas as outras faixas salariais apresentam queda constante nos
últimos anos.
Quanto
ao rendimento médio real, temos uma queda desde o ano 2015: de 2.058 reais para
1.972 atualmente. Essa queda também é sentida na massa total de salários, que
multiplica a quantidade de empregos pela renda média, ambos em queda. Os
empregos de menores salários e qualificação sofreram as maiores perdas. “De
modo geral, os trabalhadores que recebem abaixo do salário mínimo apresentaram
uma queda real nos rendimentos de quase 10% nos últimos 12 meses.” diz o IPEA[x]. A
situação se agrava num contexto de ampliação do preço da cesta básica em todas
as capitais do Brasil nesse ano[xi],
com itens tradicionais do brasileiro, como o feijão indo às alturas[xii].
Outros
itens da reprodução da força de trabalho, como tarifas públicas, também
aumentaram esse ano (assim como nos anteriores) em diversas cidades. Para o
proletariado e a massa pobre, o atendimento à saúde no SUS e a educação pública
vivem dias calamitosos, em piora acentuada. Da mesma forma, os extratos
inferiores das camadas médias veem acelerar seu processo de proletarização na
crise. Além do desemprego e redução na renda, também seus “diferenciais” são
afetados. Cresce o êxodo das escolas particulares para as públicas. Desde o fim
de 2014, cerca de 2 milhões de brasileiros perderem o plano de saúde[xiii].
E com isso, rapidamente cai a ilusão do país de “classe média” que o PT pintou[xiv]. Tudo
o que era sólido se desmancha no ar...
A
deterioração das condições concretas de vida e reprodução do proletariado, dos
demais trabalhadores e das camadas médias assalariadas também pode ser vista
pelo estouro da bolha do crédito para consumo. Segundo a última Pesquisa de
Endividamento e Inadimplência do Consumidor[xv],
o percentual de famílias brasileiras endividadas continua circulando os 60%. Já
aquelas com contas ou dívidas em atraso teve leve aumento, chegando a 22,9%.
Aumentou também as que não terão condições de pagar. A maioria dessas famílias possui
rendimento abaixo de 10 salários mínimos e se endividam via cartão de crédito.
As perspectivas de consumo e acesso a crédito também se mostram declinantes por
outra pesquisa semelhante da CNC[xvi].
Como
não há emprego, aumentem-se as dívidas. Como o salário não mais existe, é
preciso criar outras garantias para os bancos. Eis que então o Congresso
aprovou recentemente o uso do FGTS como garantia de empréstimo consignado[xvii].
Tal é a sede por mais lucros recordes dos bancos.
Diante
de todo esse cenário, tem piorado o quadro de saúde do proletariado e da massa
pobre no país. A Folha de São Paulo possui uma série recente chamada “Marcas da
Crise”, que no dia 24 último trouxe alguns dados, principalmente sobre a saúde
psíquica e humor do trabalhador brasileiro. Medo, insatisfação, transtornos de
ansiedade e depressão são alguns dos sintomas comuns possíveis de se verificar através
dos indicadores da matéria. Essa é uma tendência mundial[xviii],
cuja face mais brutal é a ampliação da taxa de suicídio, como visto na Grécia
pós pacotes de austeridade[xix].
Todo esse cenário só pode ocorrer
com/são efeitos de derrotas da classe operária na luta de classes. As suas condições de luta têm se tornado mais
difíceis (crise, ofensiva da burguesia, predomínio do reformismo nos sindicatos
e movimentos populares, ausência da posição e organização comunista), sendo
mais difíceis também resultados a curto prazo. No último levantamento sobre
reajustes salariais do DIEESE[xx], o
ano de 2015 foi o ponto de virada para datas-bases de menores ganhos: 45% do
universo investigado teve como resultado o congelamento do salário real (apenas
inflação) ou redução do salário real (abaixo da inflação). Além disso, “o
desempenho das negociações salariais não foi o mesmo ao longo de 2015. À
medida que o ano avançava, menos categorias logravam conquistar ganhos reais”.
Vêm se ampliando também os reajustes parcelados, que dobraram se comparado ao
período anterior. A título de comparação, em 2014, 90% fechou acima da inflação
(ganho real). Aqui também o setor industrial é o de maiores perdas.
As
lutas populares também têm passado por forte repressão e refluxo. A resignação de
grandes categorias de trabalhadores, com lideranças pelegas na sua absoluta maioria,
tem levado a pautas rebaixadas e aceitação sem ou com pouca resistência de
derrotas mais ou menos graves. A “proteção” ao emprego a todo custo é o ponto
de chegada de um sindicalismo “propositivo” – termo bonito para seu papel real
de colaboração de classes e de subordinação do proletariado à burguesia – que
deseducou as massas e agora já não consegue dar qualquer nível de resposta.
Somado a isso, temos o zeitgeist consumista
que se passou para as camadas populares no último período, e que busca
substituir as relações de solidariedade e assistência mútua e coletiva por valores
individualistas e obsessivas metas de vidas individuais de “ascensão”[xxi].
Fora
o glorioso movimento de ocupações de escolas pelo país, os movimentos por
pautas concretas (novamente, retirando o Fora Ele e Fora Ela) têm sofrido
derrotas. Um exemplo são os movimentos contra aumento de passagens, estopins de
2013. As crescentes repressões a manifestações e organizações apenas demonstram
que o outro lado se vacinou contra um levante de massa e está bem equipado
graças ao avanço do estado de exceção via Copa do Mundo e agora Olimpíadas.
No
campo, a velha barbárie continua e se avoluma. O título do Jornal Pastoral da
Terra, de outubro a dezembro de 2015, nada mais é que Violência no campo bate recorde esse ano:
“Isso é o
que tem se visto neste ano, com aumento significativo de assassinatos de
camponeses e trabalhadores. Em 2014, o Banco de Dados do Centro de
Documentação Dom Tomás Balduino, da CPT, registrou 36 assassinatos. Em 2015,
até final de novembro este número chegou a 46. Número superior ao total de
assassinatos de cada ano, desde 2004.”
Entre
os povos indígenas das regiões de conflitos de demarcação de terras, o suicídio
em massa de jovens e o assassinato de lideranças têm se agravado. Segundo
jornal do CIMI, só “de 26 a 30 de dezembro [de 2015], pelo menos cinco
indígenas foram assassinados no Maranhão, Tocantins, Paraná e Santa Catarina”.
No Mato Grosso do Sul, o clima é de guerra, com cerca de 400 indígenas
assassinados desde 2003[xxii].
Galinha dos
ovos de ouro da burguesia: a reforma trabalhista por vir
Com o aumento do desemprego, do subemprego e da
carestia de vida e precarização dos serviços públicos (menos os ligados à
repressão!), o proletário e sua família têm se submetido a vender sua força de
trabalho (quando consegue) por preços abaixo de seu valor. Ou a trabalhar mais
tempo (bicos, hora-extras) e mais intensamente para manter as contas em dia (o
que não tem conseguido, como vimos). Isso tudo sem perspectiva concreta de se impor
barreiras para refrear esse bombardeio – mantidas as escolhas entre as centrais
sindicais e os partidos da ordem.
Mas eis que chega o Estado Burguês e diz da
necessidade de mais sacrifícios! Ou, de forma mais sofisticada, dos sacrifícios
corretos. É preciso produzir mais, deixando o capitalista usar como deve a
força de trabalho – sem as “arcaicas” amarras legais e sindicais/coletivas;
flexibilidade para produtividade e competitividade, dizem eles. Isso apresentado
como a chave para sair da crise, ampliar os empregos e melhorar a vida do povo
trabalhador.
Esse é o espírito da atual proposta de desmonte da
CLT e do generoso pacote de propostas (ex: terceirização, reforma da
previdência) que circula no Congresso através das generosas contribuições de
confederações patronais e semi-patronais (sindicalismo pelego). Há até espaço
para sonhos grandiosos, como uma jornada a
la século XIX[xxiii]!
“[Com a
crise] O capital empreendeu uma campanha preliminar para impedir a aplicação
total da lei de 1o de maio de 1848 [de conquistas trabalhistas]. E
seriam os próprios trabalhadores que, supostamente escarmentados pela experiência,
deveriam ajudar a destruir a sua própria obra.” (MARX, O Capital, p. 397, Os Economistas). No caso
do Brasil, CUT`s da vida propuseram tal destruição antes do nobre convite
canibalesco!
Objetivamente
o que a burguesia quer é um maior controle e espaço para a exploração da força
de trabalho, retirando do caminho
limites que historicamente foram impostos pela luta de classes. O que Marx
chama de livre exploração da força de trabalho (para e pelos capitalistas).
Claro que o dito pleno emprego nunca foi e nunca será a moeda de troca nessas
ocasiões. Ao se ver a realidade do trabalho terceirizado no Brasil, a miragem
dos capitalistas se torna mais concreta: como eles querem sair da crise (e para
quem), que tipos de empregos de fato se quer gerar?
Em dossiê Terceirização
e desenvolvimento: uma conta que não fecha, do DIEESE e CUT, de 2014, vemos
que a remuneração média do trabalhador terceirizado é (óbvio!) menor que a do
trabalhador diretamente contratado. A jornada de trabalho e rotatividade, por
sua vez, são maiores (óbvio!) no setor terceirizado. Os trabalhadores mais
acidentados e em condições análogas a escrava também em sua maioria são
terceirizados. A ação sindical é fortemente afetada pelas condições de trabalho
e relação empregatícia extremamente instável.
As pontes
para o futuro da burguesia são necessariamente pontes para o passado para o
proletariado.
Preparar-se
para mais tormentas
Vimos
que são a classe operária e os trabalhadores mais precários os que mais têm
sofrido os impactos da deterioração das suas condições de reprodução. Ao mesmo
tempo que sofrem mais o desemprego, o arrocho, o endividamento, a violência
etc. mais ardilosas são as armadilhas postas, de forma chantagista, como
solução. O fundo do poço parece não ter fim, e, hoje de forma trágica, todos os
caminhos parecem levar a Pequim, o parâmetro mundial de exploração.
O novo normal só será definido com
muita luta entre as classes. Os comunistas e o proletariado precisam ter
consciência da importância da resistência nesse período; da natureza de cada avanço
e conquista. A luta e resistência da
classe operária e suas aliadas precisam necessariamente enfrentar o novo
“consenso” (em meio ao caos) da burguesia e seus aparatos – que por sua força
material ideológica imobiliza e amedronta setores inteiros dos dominados. Não
há solução simples da gama de contradições e ataques a que se expõe a classe operária
brasileira: lutar e somar experiências a fim de se somar cada vez mais à vida
das massas é nosso dever primeiro. Para que tenhamos clareza disso, eis um
valioso trecho de Engels (A situação da
classe trabalhadora na Inglaterra - capítulo sobre movimento operário) na
qual podemos substituir greve pelas mais diversas formas de luta em defesa da
melhoria de vida e contra o domínio do capital e seu Estado:
"É,
pois, de se perguntar: por que os operários entram em greve, dada a evidente
ineficácia de sua ação? Simplesmente porque devem protestar contra a redução do
salário e mesmo contra a necessidade de uma tal redução; devem expressar
claramente que, como homens, não podem adaptar-se às circunstâncias, mas, ao
contrário, as circunstâncias devem adaptar-se a eles, os homens - porque sua
omissão equivaleria à aceitação dessas condições de vida, ao reconhecimento do
direito de a burguesia explorá-los durante os períodos de prosperidade e
deixá-los morrer de fome nos períodos desfavoráveis
[....]
E as greves,
como escola de guerra, têm uma eficácia insuperável - nelas se desenvolve a
coragem própria dos ingleses. No continente, diz-se que os ingleses,
particularmente os operários, são covardes, incapazes de realizar uma revolução
porque não se entregam, como os franceses, às revoltas diárias, que, enfim,
parecem adaptar-se tranquilamente ao regime burguês. Nada mais falso; os
operários ingleses não ficam atrás de quaisquer outros no que toca à coragem e
são tão pouco cordatos quanto os franceses - mas lutam de modo diverso [...]
não é difícil compreender que uma greve exige coragem, e por vezes uma coragem
e uma resolução maiores, mais firmes, que as reclamadas por uma rebelião. Na
verdade, não é pouca coisa para um operário, que conhece a miséria por experiência,
ir voluntariamente ao seu encontro, com a mulher e os filhos, e suportar fome e
privações por dias e meses e permanecer, apesar de tudo, irredutível e
inabalável. Que coisa é a morte, que coisa são as galés que ameaçam os
revolucionários franceses, diante da visão cotidiana da família esfaimada,
diante da certeza da vingança subsequente da burguesia, que os operários
ingleses preferem a submeter-se ao jugo da classe proprietária? Mais adiante,
veremos um exemplo dessa coragem tenaz e inflexível do operário inglês, que só
cede à violência quando toda resistência se torna inútil e insensata - e é
precisamente nessa calma pertinaz, nessa constante firmeza, que supera centenas
de provas todos os dias, que o operário inglês desenvolve os aspectos mais
admiráveis do seu caráter. Homens que suportam tanto sofrimento para fazer
vergar um só burguês certamente têm condições de abater o poderio de toda a
burguesia."
Mais
tormentas se aproximam, “é preciso estar atento e forte” – já dizia a canção em
tempos sombrios.
[i] Marx (O Capital, p. 211, v. 2, Os Economistas):
“O processo de produção capitalista, considerado como um todo articulado ou
como processo de reprodução, produz por conseguinte não apenas a mercadoria,
não apenas a mais-valia, mas produz e reproduz a própria relação capital, de um
lado o capitalista, do outro o trabalhador assalariado.”
[ii] A “moral” austera, que corre o
mundo devastando as condições dos explorados para a recuperação dos capitais
pós-crash, já se encontra, obviamente, no Brasil. Dentre mil e um exemplos que
se poderia dar, ficamos com a sintética fala de um senador, citada por Pedro
Rossi na palestra Austeridade contra
democracia, de 7 de julho de 2016: “Vivenciamos no Brasil um período de
excessos, é hora de entrar no período de sacrifícios”. Claro que para o senador
o excesso é de salário, emprego, benefícios (e talvez de auxílio estatal para a
ala do capital concorrente a sua); e os sacrifícios serão das classes dominadas
– vemos isso muito bem pelo discurso e sobretudo pela prática do Congresso
Nacional. E não esqueçamos do slogan do governo-da-ordem-e-progresso: “não
pense (e não lute na/) em crise, trabalhe”. Mais conhecido pelos alemães como Arbeit macht frei...
[iii] Colunista Rafael Souto, do Valor,
sem tantas máscaras moralistas-ideológicas: “Temos que reconhecer que algo está
caminhando para o lugar certo: os salários. A bolha estourou. A pressão
insustentável por ganhos reais foi esmagada pelo implacável emagrecimento da
oferta de empresas […] Segundo dados do Banco Central, entre 2006 e 2011 os
ganhos de salários no Brasil superaram a media mundial […] A acomodação dos
salários mais baixos poderá dar mais espaço para as empresas organizarem suas
equipes e melhorarem sua performance” (Valor Econômico, 02/062016).
[v] Ortes, citado por Marx (O Capital,
p. 276, v. 2, Os Economistas): “A coação legal para trabalhar está ligada a
excessiva encrenca, violência e barulho [...] enquanto a fome não só constitui
uma pressão mais pacífica, silenciosa, incessante, mas, como motivo mais
natural para a indústria e o trabalho, provoca os esforços mais poderosos”.
[vi] Praticamente a população do Estado
do Paraná inteira, para se ter uma noção do tamanho dessa massa populacional...
[vii] Um ato falho?
[xii] No quesito alimentação, importante
fazer referência à péssima qualidade da alimentação da massa trabalhadora,
fruto da industrialização da produção de alimentos. Uma cesta básica incluindo
itens de qualidade e que vise uma dieta equilibrada é absolutamente inviável
para a maioria dos operários, trabalhadores rurais e a população pobre.
[xiv]Avanço do desemprego faz surgir a
“nova classe D” em http://www.ihu.unisinos.br/noticias/552842-avanco-do-desemprego-faz-surgir-a-nova-classe-d;
“11 anos de criação de empregos, formalização e
compressão das disparidades salarias estão sendo revertidos em pouco mais de um
ano e meio. [...] os últimos três governos ficarão para a história como uma
miragem fugaz” em http://www.ihu.unisinos.br/entrevistas/551243-os-ultimos-tres-governos-ficarao-para-a-historia-como-uma-miragem-fugaz-entrevista-especial-com-fernando-rugitsky.
[xv] Os dados são coletados em todas as
capitais dos Estados e no Distrito Federal,
com cerca de 18 mil consumidores.
[xviii] “[...] cada crise causa
indiretamente uma série de vitimas por doença” (Engels, A Situação da Classe Trabalhadora
na Inglaterra). “As vítimas do sobretrabalho sentem a injustiça tanto quanto os
condenados por ele à ociosidade forçada” (Relatório de 1863 citado por Marx, O
Capital, p. 267, v. 2, Os Economistas).
[xxi] E cuja frustração via crise tem
gerado tanto ressentimento e confusão, reforçando a ideologia reacionária e sua
caçada a bodes expiatórios. Não é à toa a consolidação do neopentecostalismo
nesse último período nacional. Movimentos semelhantes ao do Tea Party no Brasil
também possuem base semelhante. Ver: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0103-65642015000100052.
[xxii] Ver: http://outraspalavras.net/outrasmidias/capa-outras-midias/por-que-os-guarani-kaiowa-continuam-morrendo/.
[xxiii]https://economia.terra.com.br/cni-fala-em-jornada-de-trabalho-de-80-horas-semanais,90763098ae2d28715155d7d09a9fd49b80njrupv.html.
“A avidez do capitalista por mais-trabalho manifesta-se no empenho em prolongar
desmedidamente a jornada de trabalho” (O Capital, p. 351 – Os Economistas). No
século XIX tal avidez também era mascarada pelas justificativas mais cínicas e
insanas. Hoje ela se manifesta num suposto cordial acordo acima do legislado.
Mas em ambos os casos, “átomos de tempo são os elementos do lucro”, como disse
um sábio capitalista em relatório de 1860.
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