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O Congresso
Nacional aprovou o chamado Programa de Proteção ao Emprego – PPE, instituído
pelo governo Dilma/PT.
O que vamos mostrar nesse artigo é que, apesar
do nome, o PPE não constitui política para proteger o emprego, nem mesmo o dos
trabalhadores das empresas que entram no programa.
O PPE representa sim a abertura para novas
formas de intensificação da exploração da classe operária pela burguesia,
sancionada pelo Estado burguês sob a direção do PT e com o aval do sindicalismo
pelego, para fazer retroceder a posição da classe operária na luta de classes.
O PPE avança
novas formas de intensificação da exploração do trabalhador pelos capitalistas
que se projetam para além da situação imediata, setorial ou local. Também ensaia
o Acordo Coletivo Especial – ACE, projeto do sindicato dos metalúrgicos do ABC
e da CUT que faz o negociado prevalecer sobre o legislado, ou seja, flexibiliza
a legislação trabalhista para cortar direitos conquistados pelos trabalhadores.
Os dirigentes
desse sindicato têm se destacado em forçar os operários de sua base a aceitar o
PPE, entre outras perdas salariais e de suas condições de trabalho,
supostamente em troca da dita proteção do emprego ou da estabilidade prometida
pelas montadoras de veículos. Esses acordos efetivam o uso simultâneo do PPE
com o layoff (suspensão temporária do contrato de trabalho)[i] e
o programa de demissão voluntária (PDV), ou seja, coação que mantém a demissão
e o terror do desemprego sobre os trabalhadores. Em lugar de resistir o sindicato reforça a ofensiva burguesa contra a classe operária que se dá no atual cenário de grave
crise econômica, com enorme aumento das demissões, reduções de salários e
expansão das formas de trabalho sem carteira assinada.
A despeito da
aprovação dos acordos, forçada pelas chantagens da direção sindical pelega, a
luta de classes recente prova que grande
parte dos operários não considera o PPE como de seu interesse. Além disso,
a promessa da estabilidade se esvai com a continuidade das demissões e as novas
ameaças, mesmo após os acordos que impuseram perdas salariais e rebaixaram as
condições de trabalho. Põe em xeque a ilusão reiterada pelos sindicalismo burguês
de conciliação de interesses entre capitalistas e trabalhadores, ou seja, de
apoiar a exploração dos operários pelo patronato em troca de uma suposta
garantia do emprego e outro benefícios.
Portanto, mantém
aberta a possibilidade da resposta própria dos trabalhadores na resistência
contra o patronato na direção da independência política da classe operária.
PPE: ensaio do Acordo Coletivo Especial, ou seja, a tese de que o
negociado deve prevalecer sobre o legislado.
No dia 28 de
outubro, o Senado Federal concluiu a aprovação do chamado Programa de Proteção
ao Emprego - PPE, instituído pelo governo federal em 06 de julho por meio da
medida provisória - MP 680/2015.
O PPE tem
inspiração no modelo alemão de flexibilidade no trabalho, e resulta das discussões,
desde 2012, entre governo, empresários da CNI e ANFAVEA e sindicalistas da CUT,
Força Sindical e UGT.[ii]
Pelo PPE, as
empresas podem cortar até 30% da jornada de trabalho e do salário do
trabalhador. Com recursos do Fundo de Amparo ao Trabalhador - FAT, o Estado
paga metade dessa redução, até o limite de R$ 900,84, equivalente a 65% do
valor máximo do seguro-desemprego (R$ 1.385,91). E a outra metade não é coberta por ninguém: o trabalhador perde até 15%
do salário e dos depósitos no FGTS, além das perdas no 13º salário, nas férias
e no valor dos benefícios previdenciários, em caso de acidente ou doença,
decorrente do menor salário de contribuição à previdência social.
Nas regras
aprovadas do PPE, a redução da jornada e do salário pode incluir todos os
empregados da empresa ou apenas de um setor específico. Somente os empregados
incluídos contam com a chamada proteção no emprego, os demais continuam
ameaçados pelo desemprego. E mesmo essa chamada “proteção” é provisória,
equivalente a duração do programa acrescido de um terço. Após esse período, os
trabalhadores podem ser demitidos a qualquer momento.
Podem entrar
no PPE empresas de todos os setores que aleguem “dificuldades econômicas e
financeiras” sem, contudo, precisar “comprovar” dita dificuldade por meio de
seu faturamento ou receita, lucros, ativos, remessa de lucros ao exterior ou
qualquer outra informação econômica ou financeira. Basta tão somente
demonstrar, “de forma inequívoca, que a empresa tem demitido trabalhadores”.[iii]
Por exemplo, as montadoras de veículos no Brasil encabeçam a lista das maiores
empresas em remessa de lucros ao exterior: de 2010 a 2013, remeteram às suas
matrizes nada menos que US$ 15,4 bilhões. Como cortaram 12,4 mil vagas, em
2014, e seguem demitindo em 2015, podem entrar e entram no PPE, a revelia da
“saúde” financeira expressa nos recordes em remessa de lucros. Quer dizer, para entrar no programa, que
diz proteger o emprego, as empresas podem previamente remeter lucros ao
exterior e demitir trabalhadores, o que costumeiramente fazem em tempos de
crise, e assim recebem o “benefício” da redução salarial para manter ou
engordar ainda mais seus lucros. Que bom negócio o Estado burguês e o
sindicalismo pelego faz para os patrões!
O texto
aprovado, fruto da conversão da MP 680 no Projeto de Lei de Conversão – PLV
18/2015, ampliou de 12 para 24 meses o período máximo de permanência da empresa
no PPE, estendeu o prazo para adesão ao programa até 31 de dezembro de 2016 (em
lugar de 2015) e de sua vigência até 31 de dezembro de 2017.
A ampliação do
prazo de permanência, adesão e vigência aponta para efetivação do PPE, desde
seu nascedouro, como instrumento de redução salarial de forma sistemática e
permanente, isto é, não restrito a uma
conjuntura recessiva, tornando letra morta o suposto “caráter experimental”
indicado na Carta de apoio das Centrais Sindicais.[iv]
Como que a entregar esse objetivo está o fato de que a iniciativa da medida
surgiu em 2012, bem antes da crise econômica aberta, momento em que esses
sindicalistas, empresários e o governo celebravam a quimera do “pleno emprego”
e do “país de classe média”.
Dessa vez, a
emenda que estabelecia a prevalência do negociado sobre o legislado, não foi
incluída na lei do PPE. Apesar disso, o ímpeto do capital se fortaleceu anunciando
uma nova onda de flexibilização da legislação trabalhista, destinada a cortar
direitos conquistados pelos trabalhadores.
Tanto mais
pelo apoio explícito de dirigentes da CUT como sempre submissos à possibilidade
de “debater a emenda de interesse dos empresários” (Tribuna Metalúrgica n.
3792, de 08 de outubro de 2015, p.4). Sua intenção é aprovar um antigo projeto do
Sindicato dos Metalúrgicos do ABC e da CUT, o Acordo Coletivo Especial – ACE, projeto que, assim como a emenda
excluída, faz prevalecer o negociado sobre o legislado.
O PPE,
portanto, ensaia a efetivação do ACE, a submissão do legislado ao negociado.
Sua adoção requer o estabelecimento de acordo coletivo de trabalho específico
entre empresa e sindicato dos trabalhadores que permita reduzir até 30% a
jornada e o salário. Com isso, o acordo garante “segurança jurídica”, diga-se,
aos patrões, para que “condições específicas de trabalho, aplicáveis no âmbito
da empresa” prevaleçam sobre a atual legislação trabalhista.[v] Ou
seja, o PPE avança para uma nova legislação do trabalho no sentido do Acordo
Coletivo Especial.
PPE: proteção do patronato e não do emprego.
Na
fundamentação da medida, o governo ressalta a importância do PPE para
“estimular a produtividade do trabalho” e “proteger os empregos”. Igual
entendimento é sustentado pelos sindicalistas pelegos da CUT e Força Sindical.[vi] Ocorre que “aumento
da produtividade” significa o mesmo que aumento da exploração da classe
operária e tem como resultado direto a redução de postos de trabalho.
Para esses
dirigentes sindicais, é muito caro para o governo manter o trabalhador fora do
emprego. Com o PPE, o governo mantém a arrecadação (embora reduzida) com a
Previdência Social, FGTS e Imposto de Renda, por isso, dizem esses
sindicalistas, suas vantagens em relação ao seguro-desemprego e ao layoff
(suspensão temporária do contrato de trabalho). Essa justificativa coincide com a direção do “ajuste fiscal” promovido
pelo governo de reduzir conquistas trabalhistas para a contenção dos gastos mediante
a redução do direito ao seguro-desemprego. Segundo José Lopes Feijóo,
assessor da Secretaria de Governo da Presidência da República: “se 50 mil
trabalhadores [meta do PPE para 2015] acessarem o programa, o custo aos cofres
públicos será da ordem de R$ 112 milhões, enquanto o custo do seguro-desemprego
seria de R$ 290 milhões.”
Para
dirigentes da Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – Contag,
o PPE exclui os trabalhadores rurais em razão do alto índice de informalidade
do trabalho no campo, grande número de contratos temporários e remuneração
muito próxima do salário mínimo (pela medida, a redução salarial não pode
acarretar pagamento abaixo do salário mínimo).
Uma crítica ao PPE vem da Associação Nacional dos
Magistrados da Justiça do Trabalho – Anamatra. Para eles o programa pode
acarretar precarização do trabalho caso, a pretexto da crise, “instrumentos de
redução temporária de direitos” sejam “utilizados de forma sistemática”. Por
isso, sustenta que tais medidas não podem beneficiar empresas “mal geridas” e
devem ter caráter excepcional.[vii]
A ponderação
da Contag enfatiza os limites da abrangência do PPE, sem questionar seu
interesse de classe, o da burguesia. Lembramos ainda que os trabalhadores
rurais estão excluídos do seguro-desemprego. Embora chame atenção para os
agravantes da medida, a posição da Anamatra está marcada pela ideologia jurídica (pequeno-burguesa), especialmente pela
difusão da imagem do Estado “protetor” e, portanto, ocultar a dominação de
classe da burguesia que age, por meio do seu Estado, no sentido de assegurar a
reprodução ampliada do capital, portanto da exploração e, ao mesmo tempo,
desorganizar a classe operária e os trabalhadores incutindo-lhes a ilusória
expectativa da conciliação de classes pelo Estado.
O
entendimento do PPE como instrumento para aumentar a exploração dos
trabalhadores é denunciado em manifesto da Intersindical, que recusa sua adoção
em sua base.[viii]
Além de
reduzir os salários e os recolhimentos para Previdência Social e FGTS, a
empresa pode utilizar o período da redução da jornada para se tornar mais
produtiva, produzir mais em menor tempo, com ganhos de qualidade e menos
custos, aumentando os lucros e permitindo eliminar permanentemente parcela dos
trabalhadores.
Mesmo assim,
as empresas não são obrigadas a entrar no PPE, entram caso avaliem que lhes é
vantajoso.
Na verdade, não existe qualquer outra
medida jurídica que impeça os patrões de demitir os trabalhadores. O desemprego avança. No trimestre
encerrado em agosto deste ano, a taxa de desemprego passou para 8,7%, contra
6,9% no mesmo trimestre de 2014, totalizando 8.8 milhões de desempregados, 2
milhões a mais que um ano atrás. Entre setembro de 2014 e agosto de 2015, foram cortados 1 milhão e 100 mil empregos com carteira
assinada.[ix]
De um lado,
queda no nível de “formalização” do trabalho; de outro, aumento das formas de
trabalho “informal”, registrado pelas estatísticas oficiais, em um ano, com
mais 927 mil “trabalhadores por conta própria”,[x]
além do crescimento dos chamados “empregadores”, em grande parte, empregador de
si próprio.
O aumento do
desemprego acarretou a queda no salário inicial de contratação e na remuneração
média real dos trabalhadores celetistas: em agosto de 2015, reduziu 3,5%, em
relação ao mesmo mês do ano passado. Cresceram os acordos coletivos com
reajuste salarial inferior ao INPC (inflação) ou mesmo sem qualquer reajuste
como nas montadoras da região do ABC. Para os trabalhadores sem carteira
assinada, a queda é bem maior, 12,6%. Na construção civil e no comércio,
setores com grande contingente de trabalhadores na informalidade, a redução dos
rendimentos atinge 6,4% e 5,9%, respectivamente. A inflação e a desvalorização
do real frente ao dólar rebaixam ainda mais o salário médio e viabilizam a
exploração absoluta da classe trabalhadora, isto é, obriga os trabalhadores a
trabalhar mais tempo para adquirir os bens essenciais à sua sobrevivência.
Na indústria,
o número de empregos cai há quatro anos, desde outubro de 2011. Em agosto de
2015, a indústria de transformação fechou 47.944 vagas. Ou seja, um único mês cortou quase todos os 50 mil empregos que o
governo diz manter com o PPE em um ano.
Apesar do
nome, o PPE não constitui uma política de proteção do emprego. Pelo contrário.
A política do governo caminha para o corte de direitos, como a recente
ampliação de 6 para 12 meses de tempo de trabalho para o trabalhador ter
direito ao seguro-desemprego. Como veremos a seguir, com base nos acordos
coletivos nas montadoras da indústria automobilística da Região do ABC, o PPE
nem mesmo protege o emprego dos trabalhadores das empresas que entram no
programa. Trata-se sim da abertura para
novas formas de intensificação da exploração da classe operária pela burguesia,
sancionada pelo Estado burguês sob a direção do PT e com o apoio do
sindicalismo pelego para ampliar os lucros e fazer retroceder a posição da
classe operária na luta de classes.
PPE, Layoff, PDV: exploração operária com apoio do sindicalismo burguês
Até aqui
poucas empresas aderiram ao PPE. O destaque recai nas montadoras da indústria
automobilística, especialmente os acordos coletivos entre o Sindicato dos
Metalúrgicos do ABC com Mercedes Benz, Volkswagen e Ford.
Os dirigentes do Sindicato dos Metalúrgicos
do ABC têm se destacado em forçar os operários de sua base a aceitar o PPE,
além de outras perdas salariais, rebaixamento de suas condições de trabalho e
aumento da exploração capitalista. Não é de hoje que esses sindicalistas
pelegos estão na linha de frente do sindicalismo burguês no Brasil, ou seja, o
de ativamente representar e defender os interesses dos patrões e da burguesia
junto aos trabalhadores sindicalmente organizados.[xi] O
eixo central que orienta essa prática sindical se baseia em alcançar aumentos
salariais, outras vantagens ou a manutenção do emprego condicionados ao aumento
da produtividade. Quer dizer, do sindicato apoiar o aumento da exploração
operária supostamente em troca desses benefícios, geralmente, circunscritos às
grandes empresas, como as montadoras da indústria automobilística. A prática
sindical, cada vez mais, tenta limitar e isolar os trabalhadores ao âmbito de
cada empresa, convertê-los em um grupo que se fecha em torno de si mesmo para
agir em prol da maior produtividade e competividade de sua empresa. Desse modo,
o sindicato reforça o interesse de cada capitalista individual e a concorrência
entre os próprios operários, ou seja, atua para tornar os operários reféns da
acumulação e concorrência capitalista.
Essa
orientação, de apoiar o aumento da produtividade e a redução dos custos
salariais das empresas como no PPE e em outros acordos, é apresentada pelos
sindicalistas como “garantia do emprego”.
O
detalhamento dos acordos coletivos supõe o uso de vários mecanismos como uma
"estratégia" de produção com novas formas de exploração dos
trabalhadores que se projeta para além da situação imediata, setorial ou
local.
Como mostra o
Quadro 1, a utilização do PPE aparece combinado ao layoff ou mesmo à demissão
sob a alcunha de “Programa de Demissão Voluntária” – PDV. As perdas vão muito
além da redução dos salários durante o PPE, pois os acordos eliminam reajustes
salariais ou estabelecem a aplicação de percentuais abaixo do INPC.
Quadro 1: PPE e cláusulas de acordos coletivos entre o Sindicato dos
Metalúrgicos do ABC e Mercedes Benz, Volkswagen e Ford - 2015.
Empresa
|
Acordo
coletivo específico - PPE
|
Cláusulas
de acordos coletivos
|
|||
Redução de
salários e da jornada
|
Quant. de
trabalhadores
|
Duração e
Período
|
Reajuste
salarial
|
Outras
|
|
Mercedes
Benz
|
20% dos salários e da
jornada, 10% pagos pelo FAT.
Perda de 3% no 13º Salário
em 2015, e de 5%, em 2016.
|
8.700.
Todos da produção e da administração, exceto os do
setor de vendas.
|
Nove meses.
De 01/09/2015 a 31/05/2016.
|
2015: reajuste pelo INPC.
2016: metade do INPC + abono
de R$ 3.mil.
Congelamento da progressão
salarial em 2015 e 2016 e ampliação do tempo para progressão.
|
- Em outubro de 2015,
retorno dos operários com sequelas por acidentes ou doenças e demais casos de
estabilidade que estavam em layoff.
- Abertura de PDV para esse
grupo.
- “Desterceirização”.
|
Volkswagen
|
20% dos salários e da
jornada, 10% pagos pelo FAT.
|
9.300.
Excluídos os da manutenção entre outros.
|
Seis meses + quantas vezes necessárias até o limite
de 24 meses.
Inicialmente de 01/10/2015 a 30/04/2016
|
2015: sem reajuste, abono de
R$ 6.372,00. 2016: reajuste pelo INPC.
|
- layoff para 2.640
trabalhadores.
- Inclusão destes no PPE ao
final do layoff em novembro e dezembro.
- Abertura de PDV para esse
grupo.
- “Desterceirização”.
|
Ford
|
20% dos salários e da
jornada, 10% pagos pelo FAT.
|
3.300
|
Seis meses + seis meses.
Inicialmente de 01/01/2016 a 30/06/2016
|
2015: sem reajuste, abono de
R$ 8 mil.
2016: reajuste pelo INPC +
abono de R$ 1,7 mil.
|
- Layoff para 150 operários
em janeiro de 2016.
- Inclusão no PPE de 100 trabalhadores
de layoff, iniciado em maio de 2015.
- Abertura de PDV para os
dois grupos.
- “Desterceirização”.
|
No início de julho, os operários da
Mercedes Benz disseram NÃO a implantação do PPE.[xii] Recusada por 75% dos operários, a
proposta negociada e defendida pelo sindicato ainda estabelecia reajuste
salarial de apenas metade do INPC, em 2016, congelamento da progressão salarial
do plano de cargos em 2015 e 2016, bem como a demissão de aposentados e
trabalhadores com estabilidade, empregados com limitação da capacidade de
trabalho decorrente de sequelas por acidente ou doença do trabalho. Após a
recusa, a empresa demitiu 1.500 trabalhadores. Os operários responderam com
greve que durou uma semana, encerrada em 31 de agosto com acordo negociado pelo
sindicato com a empresa que reverteu as demissões e recuperou a proposta
rejeitada pelos trabalhadores.
As demissões foram utilizadas pela empresa
e pelo sindicato pelego para quebrar a resistência operária. Os dirigentes
do sindicato valeram-se desse expediente para converter a greve em mera mobilização
de apoio ao PPE e recolocar a mesma proposta já recusada pela categoria. Quer
dizer, em lugar de lutar pra valer, a direção sindical jogou a demissão dos
1.500 trabalhadores nos ombros dos próprios operários, caso a negociação fosse
novamente recusada.
No entanto, o início do PPE com a redução salarial, em
setembro, não significou a garantia do emprego. As ameaças e demissões
continuam. Em outubro, a empresa abriu PDV para demitir 250 operários com
estabilidade, justamente os empregados com sequelas de acidente ou doença do
trabalho. Esse grupo é remanescente do layoff de 2014, desde então, afastados
da fábrica. Os outros 760 operários que
estavam no layoff foram todos demitidos, 260 em janeiro e 500 em maio de 2015.
A mesma atuação sindical foi vista nos
acontecimentos da greve dos operários da Volkswagen (Anchieta) em janeiro deste
ano.[xiii]
O acordo que eliminou o reajuste salarial de 2015 foi saudado pelos dirigentes
sindicais como “vitória” pela suspensão das 800 demissões e anúncio da
“estabilidade no emprego” até 2019. Mas, o acordo anterior, de 2012, também
estabelecia estabilidade (até 2016), o que não impediu a empresa de, com o
apoio sindical, chantagear os operários com a demissão para impor perdas salariais.
E, mais uma
vez, a miragem da “estabilidade” até 2019 logo se desfez. Entre janeiro e
março, menos de três meses após a greve, mais de 800 operários foram demitidos
na VW por meio de PDV (em um ano, de agosto/2014 a setembro/2015, foram mais de
1.200 operários). Logo depois, a montadora e o sindicato acertaram um novo
layoff para 2.640 trabalhadores, 240 iniciaram em junho e 2.400 em julho. E, em
seguida, o acordo com a entrada de 9.300 trabalhadores no PPE, a partir de 01
de outubro, aí incluídos os empregados de layoff após seu retorno em novembro e
dezembro.
Essa mesma orientação pautou a negociação
sindical com a Ford. Em março, o acordo eliminou o reajuste salarial de
2015, substituído por um abono de R$ 8 mil, além de prever, para 2016, reajuste
pelo INPC mais abono de R$ 1,7 mil. Para aprovar o acordo, o Sindicato dos
Metalúrgicos do ABC, mais uma vez, procurou desarmar os operários ao vender a
ilusão da estabilidade até 2017, nas palavras de Rafael Marques, seu
presidente: "A aprovação tira de cena
qualquer ameaça de segurança em relação ao emprego."[xiv]
Em maio a
montadora colocou 100 trabalhadores em layoff e, em setembro, anunciou a
demissão de 203 operários. Os operários entraram em greve, encerrada, em 18 de
setembro, após nove dias com a suspensão das demissões e a implantação do PPE.
Assim como na Mercedes e na Volkswagen, os salários e a jornada serão reduzidos
em 20%, na Ford, a partir de janeiro de 2016, com duração de seis meses
prorrogáveis por mais seis. No entanto, o acordo estabelece a entrada de mais
150 trabalhadores em layoff a partir de janeiro de 2016, ou seja, na mesma data
de início do PPE. Os 100 trabalhadores em layoff desde maio permanecerão
afastados da fábrica. Ao mesmo tempo, a empresa abriu mais um PDV.
Nas três empresas, a adoção do PPE se faz
combinada ao layoff e ao PDV, mantendo o terror da demissão sobre os operários.
O caso da Ford deixa ainda mais visível, pois o acordo prevê um novo grupo em
layoff juntamente com o início do PPE. Ou
seja, a implantação do PPE acontece sem abandonar os mecanismos de exploração
até então utilizados. Entrar no layoff é ficar com a faca no pescoço, mas o Sindicato dos Metalúrgicos do ABC apresenta
esse instrumento como caminho para evitar as demissões. E segue o mesmo caminho
combinando-o com o PPE.
Geralmente, ao final do layoff, as empresas
abrem PDV dirigido a esse grupo, procedimento renovado, agora, em tempos de PPE.
O PDV mantém aberta a porta do inferno do desemprego. Esse instrumento quer
apresentar a demissão como ato de vontade individual de cada trabalhador,
quando na realidade resulta de forte coação das empresas sobre os operários,
agravada ao contar com a concordância sindical. Trata-se de uma forma seletiva
de demissão, utilizada para cortar os operários com sequelas decorrentes de
acidente ou doença do trabalho, bem como trabalhadores com maiores salários, em
geral, aposentados ou perto de completar o tempo para se aposentar. Ou ainda
para demitir operários vistos como ameaça pelas empresas e pela direção
sindical.
O aval sindical
ao PDV anula a estabilidade para trabalhadores com sequelas decorrentes de
acidente ou doença do trabalho, conquistada há mais de 20 anos na Convenção
Coletiva de Trabalho. O fato é ainda mais grave, pois decisão de 30 de abril
desse ano do Supremo Tribunal Federal – STF, revisando entendimento do Tribunal
Superior do Trabalho – TST, validou a cláusula que dá quitação ampla e
irrestrita de todas as parcelas decorrentes do contrato de trabalho assinada
pelo empregado, quando o item constar de acordo coletivo de plano de demissão
voluntária firmado pelo sindicato.
Além do PDV, os acordos das três montadoras
também efetivam demissões por meio da chamada “desterceirização”, isto é, a
demissão em massa de trabalhadores terceirizados para, em seu lugar, alocar
parte dos operários diretos, considerados pelas montadoras como “excedentes”.
A nota da Volkswagen, emitida após o encerramento da greve de janeiro de 2015,
deixa claro: "O resultado contempla a continuidade dos mecanismos de
adequação de efetivo por meio de Programas Voluntários, com incentivo
financeiro, e também ‘desterceirizações’ temporárias para alocação de parte do
excedente de pessoal, entre outras medidas".[xv]
A
“desterceirização” é, diz a nota, “temporária”, mas o mesmo não é válido para a
demissão e a redução dos custos salariais totais.
A chamada “desterceirização” está articulada
à redução dos custos salariais totais. Por um lado, pela diminuição do
número de postos nestas áreas em função da implantação de alterações
tecnológicas como, por exemplo, o uso da robótica nos setores de logística. De
outro lado, pela redução salarial decorrente da rotatividade de pessoal, tanto pela
demissão dos terceirizados como, tudo indica, dos operários efetivos que ocupam
provisoriamente esses postos. Isso pode acontecer ou por novas terceirizações
ou mesmo por nova contratação direta pelas empresas. No primeiro caso, como
assinalamos antes, pela forte queda dos salários de admissão no conjunto dos
setores. No segundo caso, pelo forte achatamento do piso salarial (admissão) nas
montadoras, resultado dos acordos coletivos assinados pelo sindicato, desde
2012, como pode ser observado no Quadro 2.
Quadro 2 – Piso
salarial nas montadoras Mercedes, Volkswagen e Ford: acordo coletivo 2012-2015.
Empresa
|
2012
(A)
1
|
2013
|
2014
|
2015
(B)
2
|
Reajuste
% (B/A)
|
% INPC
acumulado
|
Mercedes
|
1.560,00
|
1.688,00
|
1.688,00
|
1.688,00
|
8,20
|
18,15
|
Volks
|
1.560,00
|
1.560,00
|
1.600,00
|
1.650,00
|
5,77
|
18,15
|
Ford
|
1.560,00
|
1.560,00
|
1.600,00
|
1.600,00
|
2,56
|
18,15
|
1
A partir de 01 de setembro. 2 A
partir de 01 de março. INPC acumulado de 01/09/2012 a 28/02/2015.
Em todas as
montadoras, o piso salarial perde de longe para a inflação (INPC),
sistematicamente achatado pelos acordos sindicais, desde 2012. Dessa forma, permite
as condições para substituição dos operários antigos com maiores salários por
novos contratados.
O uso combinado do PPE com layoff, PDV, além
da “desterceirização” com o achatamento do piso salarial, é apenas a ponta do
iceberg das novas formas de exploração que se projetam, lançando mão de novos
ou antigos instrumentos. Por exemplo, o projeto aprovado pelo Congresso
Nacional proíbe a realização de horas extras (Art. 6º, § 2º) durante o período
da redução dos salários e jornada. No entanto, não menciona a utilização do
banco de horas, instrumento que prolonga a carga horária dos trabalhadores, que
continua aplicado nas montadoras durante o PPE.
A utilização
desses diversos instrumentos e suas múltiplas formas de aplicação no dia a dia
da produção também compreende o acirramento da concorrência capitalista no
setor com a chegada das montadoras coreanas e chinesas. E os dirigentes
sindicais, na cauda da concorrência capitalista, contribuem para viabilizar a
taxa de exploração e a competitividade das montadoras no ABC. É o que indica um
deles, após firmar o acordo do PPE: “A
empresa precisa se tornar competitiva frente às novas fábricas que vieram para
o Brasil. E é desafio para os trabalhadores participar do processo de
modernização da fábrica.” (Coordenador do Comitê Sindical de Empresa da Mercedes
Benz. Tribuna Metalúrgica, 02 de setembro de 2015, p. 2).
A despeito da aprovação dos acordos forçada
pelas chantagens da direção sindical pelega, a luta de classes recente nessas
montadoras prova que grande parte dos trabalhadores não considera o PPE como de
seu interesse. Tanto mais pelo fato dessa promessa falaciosa de
estabilidade no emprego ser seguidamente rasgada a cada novo “acordo” que impõe
perdas salariais e amplia a exploração dos operários, que cada vez mais
criticam a ilusão, insistentemente difundida pelo sindicato dos metalúrgicos do
ABC e outros pelegos, da identidade de interesses entre capitalistas e operários.
Os problemas enfrentados pelos operários
dessas empresas são basicamente os mesmos. Como linha auxiliar do patronato,
o sindicato pelego segue a tática de fracionar e limitar a ação dos
trabalhadores nos limites de cada empresa, isolando-os em embates pontuais
empresa por empresa.
A luta, orientada pelos reais interesses da
classe operária e não pelo sindicalismo burguês, fortalecerá a união dos
trabalhadores em seus locais de trabalho, como as iniciativas de contestação (aberta)
experimentadas pelos operários da Volkswagen, em dezembro de 2014, e da
Mercedes Benz, em julho de 2015.
Cabe aprender com esses ensinamentos, superar
seus limites e irradiar a resistência para além dos horizontes de cada fábrica
e, na luta, forjar a unidade da classe operária e dos trabalhadores.
[i]
O layoff, suspensão temporária do contrato de
trabalho, tem duração de cinco meses e durante esse período o trabalhador fica
afastado da empresa com obrigação de realizar curso de qualificação. Os
salários são pagos pelo FAT no valor máximo de R$ 1.385,91 mais a
complementação pela empresa. Na verdade, as parcelas recebidas do FAT equivalem
ao seguro-desemprego e não podem mais ser recebidas caso os trabalhadores sejam
demitidos ao final do layoff.
[ii] Coletivo Centro Victor Meyer. Programa de Proteção ao
Emprego ou ao Patrão? 18/07/2014. Disponível em http://centrovictormeyer.org.br/programa-protecao-emprego-patrao.
[iii] Conforme Ata da 5ª reunião da Comissão Mista do
Congresso Nacional que analisou a MP 680/2015. Segundo Art. 3º Inciso VI do
texto aprovado no legislativo, a comprovação é realizada com base na apuração
do chamado indicador líquido de empregos – ILE igual ou inferior a 1%. O
percentual do ILE é calculado pela diferença entre admissões e demissões
acumulada nos doze meses anteriores à solicitação de adesão ao PPE, dividida
pelo número de empregados no mês anterior ao início do programa.
[iv] Carta das Centrais Sindicais a Presidente da
República, de 15/05/2015. Disponível em http://www.cut.org.br/system/uploads/ck/files/Apoio-das-centrais-ao-ppe.pdf
[v] Sindicato dos Metalúrgicos do ABC. Acordo Coletivo
Especial. Disponível em: http://www.smabc.org.br/interag/temp_img/%7B38809CF7-87DA-4312-A498-5398482D1DE8%7D_cartilha_ace_v4_nova.pdf.
A emenda com a prevalência do negociado sobre o legislado foi incluída no
relatório aprovado pela comissão mista de deputados e senadores (art. 11 do PLV
18/2015), em 01 de outubro de 2015. O relatório pode ser acessado em: http://www2.camara.leg.br/proposicoesWeb/prop_mostrarintegra?codteor=1396735&filename=PLV+18/2015+MPV68015+%3D%3E+MPV+680/2015
[vi] Não é a toa que o projeto de ACE do Sindicato dos
Metalúrgicos do ABC e da CUT também louve a pressão por maior exploração
operária. Ao falar do exemplo da Câmara Setorial da Indústria Automotiva, de
1992, comemora o acordo “espetacular”:
“Impostos federais e estaduais foram
reduzidos, as montadoras abaixaram os preços dos veículos em 22%, os
trabalhadores aceitaram o desafio de melhorar os indicadores de qualidade e de
produtividade” (pg. 21). Ou seja, o governo reduz os impostos para que as
empresas reduzam os preços (sem redução do lucro), os trabalhadores se esfolam
de tanto trabalhar (sem aumento de salários), e os burgueses se cansam de tanto
contabilizar os lucros!
Veja
que esses mesmos princípios foram aplicados nos últimos quatro anos, com as
seguidas reduções de IPI e estímulo ao crédito, para mais uma vez engordar o
lucro burguês.
[viii] Ao invés de lutar contra as demissões CUT, Força
Sindical e UGT propõem a redução de salários, 25/05/2015. Disponível em: http://www.intersindical.org.br/mobilizacao/noticias2/item/730-ao-inv%C3%A9s-de-lutar-contra-as-demiss%C3%B5es-cut-for%C3%A7a-sindical-e-ugt-prop%C3%B5em-a-redu%C3%A7%C3%A3o-de-sal%C3%A1rios
[ix] Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística.
Indicadores IBGE: Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua – Agosto
2015. Divulgação, 29 de outubro de 2015. Disponível em: ftp://ftp.ibge.gov.br/Trabalho_e_Rendimento/Pesquisa_Nacional_por_Amostra_de_Domicilios_continua/Mensal/Comentarios/pnadc_201508_comentarios.pdf
[x] Leia: Coletivo Cem Flores. Crise Capitalista, Aumento
do Desemprego e Arrocho Salarial: a Única Saída para a Classe Operária é a sua
Luta! Blog Cem Flores, 04 de setembro de 2015. Disponível em: http://cemflores.blogspot.com.br/2015/09/crise-capitalista-aumento-do-desemprego.html
[xi] Centro de Estudos Victor Meyer. Sindicalismo burguês
e as origens do sindicalismo metalúrgico do ABC. 17 de agosto de 2015.
Disponível em: http://centrovictormeyer.org.br/sindicalismo-burgues-origens-sindicalismo-metalurgico-abc/
[xii] Coletivo Cem Flores. E os operários disseram: NÃO!
Cem Flores, 07 de julho de 2015. Disponível em: http://cemflores.blogspot.com.br/2015/07/e-os-operarios-disseram-nao.html
[xiii] Coletivo Cem Flores. A Luta Operária Contra a
Exploração Capitalista e o Sindicalismo de Parceria com o Capital e o Governo.
Cem Flores, 16 de fevereiro de 2015. Disponível em http://cemflores.blogspot.com.br/2015/02/a-luta-operaria-contra-exploracao.html
[xiv] Acordo entre metalúrgicos e Ford prevê estabilidade
até 2017. Rede Brasil Atual, 26 de março de 2015. Disponível em: http://www.redebrasilatual.com.br/trabalho/2015/03/propostas-que-beneficiam-metalurgicos-sao-aprovadas-na-ford-6808.html
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