sábado, 7 de julho de 2018

A Crise Infinita

António Barata

Nos dias que correm é unanimemente considerado, da esquerda à direita, que a crise que vivemos é culpa do neoliberalismo, da intervenção da troica e do FMI. Se a estes factores o BE, e principalmente o PCP, acrescentam a falta de patriotismo das camadas dominantes da burguesia portuguesa, sempre pronta a aceitar as imposições do Eurogrupo, do Banco Central Europeu, da Alemanha, da França e do FMI, já o PS, PSD e o CDS, preferem responsabilizar o “despesismo” de Guterres e dos governos que se lhe seguiram, em particular os de Sócrates, que teriam levado o país à bancarrota.

AS ILUSÕES DA ESQUERDA

Sendo tudo isto é verdade, o simplismo de tais pontos de vista em vez de esclarecer, confunde e mascara a realidade. Porquê?

Em primeiro lugar, porque ao responsabilizar o neoliberalismo – ou como dizem, o “sequestro do poder político pelo económico”, a “desregulamentação dos mercados” e a “financiarização da economia” – a esquerda nada mais fez e faz que estabelecer uma divisão artificial entre um capitalismo supostamente bom (aquele que produz mercadorias e cria riqueza) e um outro capitalismo supostamente mau (aquele que, sendo improdutivo, vive da especulação financeira, isto é, da compra e venda de dinheiro, ações e títulos). Colocadas as coisas desta maneira, o caminho que esta esquerda nos aponta é o da derrota (a crise ser paga pelos trabalhadores e pelos pobres e não pelos ricos), iludindo-nos sobre a possibilidade de um capitalismo ético, aclassista, regulado, democrático e ao serviço do “bem comum”. A que somam a crença de que as falências, destruição de valor, precariedade, desemprego, miséria, guerras, regressão social e fascização provocadas pela crise capitalista actual podem levar ao fim do neoliberalismo e do capitalismo tal como o conhecemos. É como se – por artes mágicas, sem a “chatice” de terem de propor projectos alternativos de sociedade, mobilizadores e capazes de elevar a consciência dos trabalhares enquanto classe com interesses opostos aos do capital e a sentir-se obrigados a se organizar politicamente para os fazer valer – o neoliberalismo e o capitalismo pudessem ser derrotados em resultado exclusivo das suas contradições internas, sem a necessidade de alguma classe os derrubar.

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