sexta-feira, 22 de setembro de 2017

O referendo na Catalunha e a autodeterminação dos povos.

Com a aproximação do referendo sobre a independência da Catalunha, marcado para 1° de outubro pelo governo local (“Generialitat”), assiste-se a uma escalada repressiva coordenada pela Espanha contra a luta do povo catalão.

Considerando o referendo “ilegal”, as autoridades espanholas e seus “aliados”, inclusive de “esquerda”, agindo como verdadeiros representantes dos capitais espanhóis que são, têm utilizado de seu gigantesco aparato midiático e repressivo para sufocar a vontade da maioria popular e sua massiva mobilização. Diariamente, “comentaristas” falam da ilegalidade, da intransigência e da irracionalidade da luta pela independência; autoridades espanholas ampliam o tom das ameaças que, de fato, tem se concretizado. O Tribunal Constitucional espanhol tem acatado os pedidos do governo de Mariano Rajoy para tentar impedir o avanço do processo de independência. Na manhã de 20 de setembro de 2017, vários membros do governo catalão foram presos pela polícia espanhola, que também ocupou vários órgãos da Generialitat e locais pró-independência, atropelando a limitada autonomia política da região. Segundo o site Público, de Portugal, a polícia espanhola também apreendeu quase dez milhões de boletins de voto para o referendo, além de estar censurando ostensivamente a propagando do evento. E são esses senhores que pedem cinicamente por “diálogo”!

O aumento da repressão tem sido respondido com manifestações na região e demonstrações de solidariedade à luta por autodeterminação dos catalães ao redor do mundo. Se impedem as urnas, o povo irá às ruas! Dezenas de milhares tomaram as ruas de Barcelona e de várias outras cidades da Catalunha essa semana e prometem não sair delas. Uma greve geral já está convocada para o dia 03 de outubro. Essa mobilização contagia e amplifica a luta dos outros povos dominados pela Espanha, como demonstram as recentes manifestações na Galiza, no País Basco etc.

O risco dessa mobilização popular confrontar-se mais forte e diretamente com os desígnios do imperialismo já é objeto de temor das burguesias da região europeia. As lutas de libertação nacional nos países dominados pelo imperialismo pode, em determinadas situações concretas, impulsionar fortemente a luta pelo socialismo nesses países e em outros. Só é possível libertar-se do verdadeiramente da dominação imperialista sabendo unir a luta pela libertação nacional com a luta pelo revolução proletária.

Buscando contribuir com a disputa política e ideológica no movimento e se solidarizar com o mesmo, divulgamos a Carta aos comunistas espanhóis e do mundo respeito aos acontecimentos na Catalunha, do Primeira Linha (Galiza), logo abaixo, e a tradução para o português do texto de Lenin A revolução socialista e o direito das nações à autodeterminação, também divulgado no sítio dos camaradas galegos, que pode ser acessado em pdf aqui.

É dever dos comunistas apoiar a luta ao povo catalão, galego, basco e de outros povos dominados contra a opressão espanhola!

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Carta aos comunistas espanhóis e do mundo respeito aos acontecimentos na Catalunha

Primeira Linha

“O proletariado das naçons opressoras nom pode limitar-se a pronunciar frases gerais, esterotipadas, contra as anexaçons e pola igualdade de direitos das naçons em geral, frases que qualquer burguês pacifista repete. O proletariado nom pode silenciar o problema, particularmente “desagradável” para a burguesia imperialista, relativo às fronteiras de um Estado baseado na opressom nacional. O proletariado nom pode deixar de luitar contra a manutençom pola força das naçons oprimidas dentro das fronteiras de um Estado determinado, e isso equivale justamente a luitar polo direito à autodeterminaçom.

Deve exigir a liberdade de separaçom política das colónias e naçons que a “sua” naçom oprime. Em caso contrário, o internacionalismo do proletariado será vazio e de palavra; nem a confiança, nem a solidariedade de classe entre os operários da naçom oprimida e opressora seriam possíveis; ficaria sem desmascarar a hipocrisia dos defensores reformistas e kauskianos da autodeterminaçom, quem nada dim das naçons que a “sua própria” naçom oprime e retém pola força no “seu próprio” Estado.”
(Lenine)

2017 é um ano importante para a classe operária e o conjunto dos povos trabalhadores do mundo.

Há 150 anos era publicado o primeiro livro do Capital onde Marx analisa e debulha a complexidade do modo de produçom capitalista, facilitando que por meio do método dialético o proletariado compreenda o funcionamento das leis de acumulaçom e exploraçom que lhe permita a tomada da consciência para destruir a ditadura burguesa.

Há 100 anos o proletariado russo, encabeçado polo partido bolchevique dirigido por Lenine, demonstrava que sim é possível tomar o poder por assalto e sentar as bases para construirmos um mundo novo, alternativo ao caos capitalista, a sociedade comunista.

Há 50 anos o Che era assassinado na Bolívia combatendo coerentemente pola emancipaçom e libertaçom dos povos latinoamericanos e do conjunto do planeta.

Nuns dias o povo da Catalunha quer decidir livremente o seu destino como naçom mediante umha consulta popular na forma de referendo, exercendo assim o direito de autodeterminaçom.

Perante este cenário, salvo contadas exceçons, a prática totalidade das forças e partidos espanhóis que vos reclamades comunistas, estades alinhados com o bloco de classes oligárquico espanhol, escusando-vos na ausência de “garantias” mínimas que legitimem a consulta.

Outras forças que vos reclamades “marxistas-leninistas” trivializades os acontecimentos, mantendes umha passividade cúmplice, negando a validez do processo em curso sob artificiais justificaçons de “classe”.

Perante este cenário, no que por primeira vez desde a sua imposiçom há quatro décadas o atual regime postfranquista está sendo avalado, e portanto existem possibilidades reais de avançar na ruptura da dominaçom exercida polo bloco oligárquico sobre as classes trabalhadoras e os povos oprimidos, os que vos reclamades “comunistas” optades por situar-vos do lado da burguesia e do imperialismo.

Para nós, comunistas galegos, para nós comunistas galegas, nada do que está acontecendo, nos surpreende.

O PCE/IU volta a repetir a traiçom de 1977 quando adire à reforma do franquismo em troques de migalhas institucionais aos seus dirigentes, atraiçoando assim décadas de luita de dezenas de milhares de militantes no combate antifascista.

As organizaçons que vos situades à esquerda do postcarrilhismo, sodes incapazes de agir como verdadeiros comunistas. Desconhecedes ou ainda mais grave, negades-vos a implementar a teorizaçom leninista sobre o direito de autodeterminaçom dos povos, ou no melhor dos casos defendedes este direito no ámbito exclusivamente formal, torpedeando o seu exercício.

Carecedes da coragem política e da coerência ideológica essencial para despreender-vos da cultura chauvinista, do supremacismo espanhol que emana dos poros do vosso oportunismo e capitulaçom. Sodes incapaces de quebrar com a dilatada trajetória imperialista e genocida do Estado opressor espanhol que pretendedes perpetuar sob a forma de “República federal e popular”.

Lamentavelmente esta atitude nom é nada nova na história do movimento operário mundial. Ai está a vergonhenta prática do Partido Comunista Francês contrário à independência das suas colónias na Indochina e na Argélia, legitimador do imperialismo e militarismo galo, sempre justificado, como agora fazedes vós, em que as reivindicaçons independentistas “dividem a classe operária”. Leede Ho-Chi-Minh e o general Giap.

Quanto cinismo e quanta falácia se ocultam por trás destas vergonhentas desculpas!

Atualmente som as luitas de libertaçom nacional os elos fracos da cadeia de dominaçom capitalista no Estado espanhol. Sem lugar a dúvidas, hoje, a determinaçom da maioria do povo trabalhador da Catalunha de quebrar o submetimento nacional que padece por Espanha, é quem pode avalar este regime autoritário, este governo bandido, responsável polo empobrecimento, da precarizaçom e da eliminaçom de direitos e conquistas básicas do conjunto da classe trabalhadora do Estado.

O enfraquecimento do bloco oligárquico espanhol que a independência da Catalunha provocaria, facilitaria a luita da classe operária espanhola pola sua emancipaçom, abrindo um cenário mais favorável para os objetivos revolucionários consusbtanciais aos partidos comunistas.

Esquecestedes, ou quiçás nunca lestedes em profundidade o marxismo, e portanto nom saibades que a libertaçom das naçons oprimidas é umha premissa para a revoluçom socialista na própria naçom opressora.

Contradiçom principal e contradiçons secundárias

Sem lugar a dúvidas o atual processo independentista catalám está dirigido pola pequena e mediana burguesia. Mas também é indiscutível que a esquerda revolucionária desse país é um dos atores destacados nesta luita popular.

Em qualquer luita, e mais se atinge umha dimensom de massas, há umha contradiçom principal e há contradiçons secundárias.

Hoje a emancipaçom da naçom catalana da dominaçom que padece polo Estado espanhol é a contradiçom principal. Atingido esse objetivo, a classe operária catalana em aliança com os setores populares e empobrecidos pola sua burguesia, tem como tarefa prioritária desputar a direçom da nova República ao PdCat e ERC, para “mudá-lo todo”.

Mas a prioridade é conquistar primeiro a liberdade nacional, pois pola atual correlaçom de forças nom seria possível avançar para umha República Socialista Catalana e contribuir para quebrar a UE e a NATO.

Ou é que na Revoluçom Bolchevique nom houvo fevereiro antes de outubro?

Porém, os mal denominados “comunistas” espanhóis aferrades-vos a dogmas antidialéticos apelando aos interesses “gerais” da classe obreira para teorizar sobre a vossa cumplicidade com a santa unidade de Espanha.

Ou para justificar as vossas políticas conciliadoras e pactistas, apelades a um inviável referendo pactuado com o Estado. Inofensivo brinde ao sol que entusiasma as forças mais reacionárias: o social-liberalismo de punho e rosa, o neofalangismo cidadanista e o PP franquista, como se constatou nas intervençons de Coscubiela no Parlament! Aplaudiam-lhe com euforia, lembrades?

Mas desde quando um processo de transformaçom social, de libertaçom nacional, se atingiu sem luitar, sem confrontar, unicamente mediante negociaçons e acordos com o inimigo?

Os vossos compromissos com o regime do 78, os privilégios atingidos polas vossas burocracias e castas, imposibilitam-vos agir como a situaçom histórica exige e demanda.

Hoje na Catalunha está-se a viver umha revoluçom nacional-democrática, que se triunfa nom só deixara ferido de morte o capitalismo espanhol, sentará as bases para que o seu povo trabalhador aproveite esta oportunidade para avançar face umha transformaçom social, umha Revoluçom Socialista.

Um povo que oprime outro nom pode ser livre, sentenciou Marx, mas vós seguides aferrados ao paradigma estatalista, alimentando o ilusionismo dumha hipotética 3ª República que pola sua benovolência e arte de mágia desative as reivindicaçons nacionais, pois o único que pretendendes é perpetuar idêntico quadro espanhol de acumulaçom e expansom de capital. O mesmo o cam com diferente colar!

Nom só disvirtuades e vulgarizades o marxismo, despojáde-lo da sua carga profundamente revolucionária, confundindo a classe operária, reforçando os mecanismos de alienaçom consubstanciais ao nacionalismo espanhol.

Sabemos que nada podemos esperar dos que dirigides as forças autodenominadas “comunistas”, dos que arrastades com obsceno orgulho nas vossas siglas a E de Espanha. Nom sodes mais que uns socialchauvinistas que tendes adulterado e deturpado o marxismo. Estades esterilizados para promover umha revoluçom operária e popular!

Mas a militáncia honesta e entregada que militades no comunismo espanhol deveriades refletir sobre o que está acontecendo estes dias nas ruas e nos centros de trabalho da Catalunha. Hoje mesmo os estivadores do porto de Barcelona em assembleia decidírom nom colaborar com as forças de ocupaçom espanholas, negando-se a abastecer os barcos inçados de polícias.

Limites e perspetivas da luita catalana

Embora temos a nossa opiniom sobre os limites do processo em curso na Catalunha, derivado da hegemonia burguesa e da falta de incidência dumha linha nitidamente comunista na sua direçom que questione a errónea orientaçom pacifista, cidadanista e democraticista, nom somos quem para dar leiçons.

Só alertamos que se a direçom burguesa encabeçada polo PdCat e ERC se arruga perante a represom espanhola, se nom se altera o mantra de nom “cair em provocaçons”, a vitória de Madrid está assegurada.

Cenário que provocará a desativaçom do movimento e umha tremenda frustraçom popular perante a incapacidade de derrotar o punho de ferro que demandam as empresas do Ibex 35 e que já leva dias ensaiando a camarilha fascista de Rajói por meio do seu aparelho judicial, mediático e policial.

A ocupaçom das ruas, o bloqueio e colapso das instituiçons espanholas na Catalunha, a greve geral e a declaraçom unilateral da República catalana polo Parlament som algumhas das ferramentas a ativar para evitar um novo 11 de setembro de 1714 e um novo Fossar de les Moreres.

Mas todo isto está em maos do povo trabalhador catalám e depende das decisons que podam adotar as organizaçons revolucionárias da Catalunha.

Apelo aos comunistas

Quando a oligarquia do Estado espanhol segue acumulando ingentes forças policiais da sua poderosa maquinára repressiva para esmagar a sangue e fogo a firme vontade do povo trabalhador catalám de ser República soberana, quando a confrontaçom é inevitável, o clamoroso silêncio dos partidos e organizaçons comunistas do mundo é umha traiçom ao ideário de Marx e Lenine.

Primeira Linha apela ao conjunto dos partidos e organizaçons do mundo que se consideram comunistas a apoiar explicitamente a luita de libertaçom nacional da Catalunha, da Galiza e de todas as naçons oprimidas polo bloco oligárquico que dirige o Estado espanhol.

O internacionalismo proletário define a açom teórico-prática comunista. A que esperades para aplicá-lo!

Galiza, 21 de setembro de 2017

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